Quase um século atrás, Virgulino Ferreira da Silva, eternizado pelo povo brasileiro como Lampião, fugia com seu bando de cangaceiros por entre a dura paisagem do agreste nordestino, acompanhando o curso do rio São Francisco. Foi ali, no meio dos cactos e sobre a árida terra seca da Caatinga, que os jagunços sofreram uma emboscada e encontraram o fim de sua era de crimes e do misticismo folclórico que os seguia por onde andavam.
A cidade de Piranhas, em Alagoas, foi o local de partida da comissão policial responsável por dar cabo às vidas de Lampião, Maria Bonita e mais nove cangaceiros presentes no confronto. Em um ato histórico, os policiais degolaram os jagunços e, em uma demonstração de autoridade, exibiram suas cabeças não só na pracinha de Piranhas, mas também em mais 12 cidades, até serem enterradas a pedido da família de Lampião.
Hoje, Piranhas é a única cidade nordestina inteiramente tombada pelo IPHAN como Patrimônio Histórico Nacional, e suas casinhas coloridas recebem nova pintura a cada dois anos para fins de preservação. É daqui que parte o passeio pela Rota do Cangaço, um trajeto que segue os rastros da última e fracassada trilha dos cangaceiros do sertão.
O PASSEIO À ROTA DO CANGAÇO

Na Grota do Angico, homenagem aos cangaceiros caçados e mortos em dia histórico. Foto: Flickr/Maria Hsu.
Piranhas está localizada no extremo sul de Alagoas, a aproximados 270 quilômetros da capital Maceió, e é ladeada pelo rio São Francisco, fronteira natural entre Alagoas e Sergipe. São oito horas percorridas na estrada, contando ida e volta entre Piranhas e Maceió, portanto já deixamos a dica aqui: para fazer esse passeio, prefira se hospedar na cidade ao invés de fazer o bate-e-volta. Assim, você evita cansar e pode aproveitar as atrações dos arredores, como o Cânion do Xingó (leia mais sobre o cânion aqui na nossa seção sobre o rio São Francisco).
O percurso da Rota do Cangaço é feito em parte pelas águas do Velho Chico, em parte seguindo uma trilha em meio à Caatinga. O objetivo é chegar à Grota do Angico, como é chamado o local do confronto entre os cangaceiros e os policiais. A Grota fica na cidade de Poço Redondo, em Sergipe, a mais ou menos 12 quilômetros de Piranhas, e é por conta dessa distância que é preciso pegar carona no rio. Curiosamente, a rota a partir de Piranhas ainda é mais prática do que de algum ponto do estado de Sergipe — Lampião escolhia caminhos tortuosos para seu bando, dificultando possíveis perseguições.
Leve água e um chapéu para andar pela trilha; o guia te levará por um percurso em pleno sertão nordestino, e o calor ali é cruel. No caminho, note as singularidades da vegetação de Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, e preste atenção quando vir uma casinha de taipa (ou pau a pique), que pertenceu a um dos coiteiros* de Lampião.
O fim da trilha recompensa os andarilhos com a visão dos túmulos dos 11 cangaceiros mortos pelos policiais, erguidos no mesmíssimo lugar onde perderam suas vidas. A volta possibilita ainda um mergulho refrescante nas águas do São Francisco, uma pedida necessária após o calor do sertão, e, para encerrar, uma visita ao Cangaço Eco Parque, um lugar amplo, com muito verde e equipado com cadeiras e sofás confortáveis para um descanso às margens do Velho Chico. Com todos os serviços citados incluídos, o passeio sai por volta de R$ 100.
*Pessoas que, contra a lei, forneciam abrigo aos cangaceiros.